Rose Guglielminetti
DA AGÊNCIA ANHANGUERA
rose@rac.com.br
Na era da internet, em que os portais, blogs, Twitter e YouTube possibilitam o acesso à informação de forma democrática, a classe política não sai ilesa e passa a ser alvo dessas novas tecnologias. Os eleitores não precisam esperar mais quatro anos para ter informações sobre o desempenho de determinado político — podem julgá-los minuto a minuto e passam a ser juízes do comportamento de seus representantes. Prova disso é a campanha Adote um Vereador, que estimula o eleitor a desenvolver um blog que relate as atividades dos parlamentares de todo o País. O projeto está hospedado na Wikia Politics (http://vereadores.wikia.com/), uma variante da enciclopédia virtual Wikipedia (http://wikipedia.com/) voltada à política.
A ideia é simples e foi lançada em outubro do ano passado pelo jornalista Milton Jung. Acabou se transformando em um site colaborativo. Cada cidadão é estimulado a escolher um parlamentar de sua cidade e, a partir daí, deve criar um diário eletrônico sobre as atividades desse legislador. A campanha já conseguiu adeptos em várias cidades brasileiras, mas em Campinas ainda engatinha. Dos 33 vereadores campineiros, apenas um foi adotado: Sérgio Benassi (PCdoB). Na Capital paulista, por exemplo, dos 56 parlamentares, 81,8% foram adotados. Em Jundiaí, nove dos 16 vereadores estão sendo “vigiados” por eleitores.
Os critérios de escolha para adoção de um vereador nem sempre estão relacionados à afinidade política. No caso do estudante universitário Paulo César Amaral Junior, a escolha pelo nome de Benassi foi aleatória. “Não tive nenhum motivo para escolher esse vereador. Na verdade, nem o conhecia. Passeando pela internet, vi que era possível criar um blog cuja ideia é mostrar como pode ser fácil manter um olho neles e também, em período de eleições, disponibilizar uma sólida rede de informações sobre cada vereador da Câmara”, explica. O novo “vigia” de Benassi tem 21 anos e é estudante do curso de ciências da computação. Atualmente, ele faz estágio em uma empresa de tecnologia em Campinas.
O primeiro post do blog está registrado no dia 8 de maio. Nesse espaço, o leitor irá encontrar desde os projetos apresentados pelo parlamentar até as perguntas encaminhadas por Amaral Junior à assessoria de imprensa de Benassi. Há também links de outras páginas com conteúdo semelhante de fiscalização da classe política. No próprio texto, o estudante esclarece aos leitores que ainda não conseguiu um canal direto de comunicação com Benassi. Ele também deixa claro que não recebeu respostas para algumas das perguntas que foram solicitadas. “Eu estava contando com essas informações para escrever o post, por isso acabei ficando sem material. Mesmo sem um aparente apoio, eu vou continuar com o blog e eu mesmo procurarei pelas informações”, escreve no post.
Escolhido entre os 33 parlamentares campineiros, Benassi diz que a construção do blog é positiva como instrumento de fiscalização. Porém, ele acredita que só terá efeito se esse acompanhamento resultar em uma aproximação dos conteúdos programáticos e engajamento político por parte dos fiscalizadores. “Acho que nasce de uma curiosidade política, estimula o controle e a fiscalização e pode consolidar num engajamento”, avalia.
No “frigir dos ovos”, acredita Benassi, o controle vai fazer com que o conteúdo programático das câmaras seja mais qualitativa. Por outro lado, o parlamentar também alerta que os vereadores ficam reféns de seus “pais adotivos”. “A gente não sabe com quem está lidando”, pondera.
Para participar da proposta, basta se cadastrar no endereço http://vereadores.wikia.com/ e escolher um vereador. O próximo passo é criar o próprio blog. A obtenção de informações pode ser feita por meios oficiais — site do parlamentar, site da Câmara, TV legislativa — ou ainda pelo envio de questionamentos aos parlamentares. O contato pessoal também pode ser feito. Para isso, basta ir até as sessões plenárias ou visitar o gabinete do parlamentar escolhido.
SAIBA MAIS
Cidades que tiveram vereadores adotados
Barretos
Belford Roxo
Brasília (deputados distritais)
Campinas
Campo Grande
Cuiabá
Curitiba
Diadema
Ferraz de Vasconcelos
Florianópolis
Fortaleza
Goiânia
Ipameri
Jandira
Jundiaí
Maringá
Mauá
Mossoró
Naviraí
Pedro Leopoldo
Piracicaba
Porto Alegre
Ribeirão Preto
Rio Claro
Rio Janeiro
Santana de Parnaíba
São Paulo
Taboão da Serra
PONTO DE VISTA
João Miras
Consultor político, de 48 anos, já dirigiu mais de 70 campanhas eleitorais no Brasil e no Exterior; na RMC, elegeu prefeitos em 11 cidades
Haverá um homem para cada Sarney na rede
Quando comecei na comunicação política, há 25 anos, fazíamos layouts à mão de artistas e passávamos por fax (que era um milagre à época) para aprovação dos políticos-clientes. No início da década de 90, já contávamos com os celulares e podia “tocar” — por assim dizer — uma campanha no Mato Grosso, mesmo estando em Recife, dirigindo outra. A tecnologia da comunicação vem revolucionando o mundo nas últimas décadas. Mas são apenas ferramentas. A magia ainda está na necessidade vital que o homem tem por adquirir conhecimento. Conhecer os fatos — conhecer-se a si mesmo. A comunicação é a gênese da existência humana. A internet era a mais recente novidade, mas ela abriu possibilidades para as trocas de arquivos sofisticados, às artes em geral, à música, à literatura e agora já é blogs, twitters, fliks, wikia, wikipédias, googles, youtubes. Já são tantas as jangadas que viajam neste infoMar, aproveitando desta infoMaré, que até a política vem sendo redespida das artimanhas que o homem público sempre tentou enredá-la. Obama falou que “we begin this journey” sem possibilidades concretas de vitória, mas, entretanto, ela se concretizou a partir da revolução da comunicação via rede, que pautou o processo eleitoral e desmontou as grandes e carcomidas máquinas financeiro-políticas antiquadas dos dois grandes partidos americanos. Agora mesmo no Irã, Mahmoud Ahmadinejad parece acuado pela força da ferramenta do Twitter, que levou ao mundo o conhecimento da violência estatal. Simplesmente não deu para censurar a nova mídia, que no entanto não existiria sem a coragem de quem apertou o botão da máquina de filmar. Felicito a iniciativa do Adote um Vereador. É mais um tapa na cara da nossa pobre e despreparada classe política, que insiste em não escutar a voz rouca da rua e sentir a evolução das novas gerações, estimuladas pelas novas mídias. O homem legislativo (vereador), fiscalizador do Executivo, paradoxalmente será fiscalizado de forma sistemática pelos cidadãos. Mas devemos fazer o mesmo com os ocupantes dos executivos, pois atacar só as assembleias para livrar a cara dos poderosos de plantão também é uma desfaçatez que atenta contra a democracia. Em breve, haverá milhares de homens com vergonha na cara para cada Sarney na rede. Na rede, se dará a próxima revolução, que por mais ficcional em sua origem, redundará em novos maios de 68. Punhos cerrados na rede: cuidado senhores políticos há jovens dispostos a entrar na frente de seus tanques de cinismo numa Praça da Paz Celestial Virtual, num novo game da moda.